Enrique Peñalosa, o ex-prefeito que transformou a capital da Colômbia, Bogotá, em uma referência em termos de bom urbanismo, lembrou em entrevista recente que “nos países em desenvolvimento a maioria das pessoas não têm carro. Portanto, quando você faz uma boa calçada, está construindo democracia. Calçadas são símbolos de igualdade”.
Neste momento em que a Administração de Ceilândia está prestes a cometer mais um erro, cujas vítimas serão os moradores do Setor P Sul, este tema torna-se ainda mais relevante. Estamos falando da decisão de transformar o canteiro central das avenidas P2, P3 e P4 em estacionamentos. A medida visa a agradar aos comerciantes daquele Setor, que reclamam da falta de vagas para os carros dos clientes.
É sempre bom lembrar que o projeto original do Setor P Sul (e do P Norte também) não previa a presença de estabelecimentos comerciais naquelas avenidas. O comércio deveria concentrar-se nas entrequadras. Com a falta de fiscalização, no entanto, os comércios foram-se multiplicando, até que não houve outra solução senão legalizar o que deveria ser ilegal. Quanto a isso, nada mais pode ser feito.
Mas existem outras maneiras de atender às demandas dos comerciantes, sem perder de vista os interesses dos demais moradores, a maioria deles pouco consciente dos prejuízos que certas mudanças podem trazem à sua qualidade de vida. Nas semi-urbanizadas e mal cuidadas entrequadras (as shopping quadras) do Setor P Sul há espaço de sobra para se fazerem vagas para estacionar carros. E em vez de estacionamentos, o que as avenidas em questão (e muitas outras na cidade) necessitam é de calçadas decentes.
Custaria bem menos aos cofres públicos a construção de calçadões em frente às lojas, de ambos os lados da via, ao longo de cada quadra, ampliando-se as estreitas passarelas por onde circulam hoje os pedestres. Com isto, as pessoas que têm carro (e que são uma minoria), poderiam deixá-los nas entrequadras e fazer um agradável passeio até às lojas.
Aquelas avenidas tornar-se-iam belos e movimentados bulevares se, ao longo dos calçadões, fossem colocados bancos formando minipraças, áreas de convivência para todos os moradores. O número de pessoas circulando em fente às lojas aumentaria. E como o tempo de permanência destas pessoas no local seria maior, cresceria também o consumo, já que elas teriam mais tempo para se informar melhor sobre o que cada loja oferece. Barcelona, com as Ramblas, ou Buenos Aires, com a Calle Florida, são apenas dois exemplos de cidades onde esta solução foi adotada com sucesso, beneficiando pedestres e comerciantes.
É importante ainda chamar a atenção para o fato de que, a esta altura, seria quase um crime remover as árvores adultas do canteiro central daquelas vias.
Para que as principais avenidas do Setor P Sul ganhassem uma nova face seria necessário ainda reverter outro erro absurdo cometido no passado, que foi a permissão para que alguns moradores invadissem parte da área reservada à circulação de pedestres com infames puxadinhos que enfeiam a cidade e roubam espaço da população, obrigada a caminhar por calçadas estreitas (onde elas existem) e mal conservadas. Para ver a que ponto o descaso deixou chegar a situação, clique aqui (100% Ceilândia).
A Administração de Ceilâdia nunca deu atenção às poucas calçadas da cidade. Até a tarefa de construí-las quase sempre foi deixada a cargo dos moradores. Cada um fazia a sua como queria ou podia. O resultado é uma cidade com calçadas de alturas e larguras diferentes. A falta de uniformidade, além do fato de muitas serem usadas indevidamente como estacionamento, sob a complacência do poder público, faz com que o simples ato de caminhar de uma quadra a outra se transforme em verdadeiro suplício. São inúmeros os casos de pedestres que se acidentam.
Ao priorizar mais uma vez os automóveis, premiando a preguiça de motoristas e a pouca visão de alguns comerciantes, a Administração de Ceilândia dará mais um passo no aparentemente irrefreável processo de desumanização de nossa maltratada cidade.
Vale salientar que a principal avendida da cidade, Avenida Juscelino Kubitschek (Hélio Prates), deverá perder o canteiro central para as obras do programa Brasília Integrada. Segundo o projeto, o local será utilizado como um corredor exclusivo para ônibus.
Fonte: Ceilândia.com
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