segunda-feira, 14 de junho de 2010

A arte de Break

Ligado ao movimento cultural de Ceilândia, João Break, 42 anos, participa ativamente da CeiCine, coletivo cultural que produz cinema e ações diversas na cidade. Com amigos como o cineasta Adirley Queirós e o preparador de atores Edmilson Braga, João Break põe a câmera nos ombros e capta imagens que serão transformadas em documentários. Atualmente, participa da Cia. de Trincheira de Teatro, que pesquisa na Escola Parque da 313/314 Sul a história de Honestino Guimarães, líder estudantil desaparecido durante a ditadura militar. A ideia é documentar os ensaios.

A relação de João Break, 42 anos, com a arte começou bem antes de pegar uma câmera: na adolescência, quando cursava o ensino médio no Centro de Ensino Profissionalizante (CEP) na QNN 14 (atual Escola Técnica de Ceilândia), em 1983. Durante uma caminhada pelo pátio do colégio, o estudante avistou um anúncio colocado numa das paredes com a seguinte frase: “Precisa-se de atores”. O “chamado” levou o aluno ao encontro dos professores Chico Morbeck e Paulo Roberto Rapadura, que, na época, estavam em busca de intérpretes para montar a segunda geração do grupo amador Teatro Favela, criado em 1975, por uma equipe de professores da Secretaria de Educação do Distrito Federal.

João Break lembra que o cartaz levou dezenas de jovens ao encontro dos dois professores, que realizavam entrevistas para selecionar os novos integrantes do grupo. Encerrada a seleção, a companhia ressurgiu com 50 atores no elenco, que logo iniciaram os trabalhos no Favela. “A oficina nos permitiu conhecer os segmentos que fazem parte do universo cênico tais como a ocupação do ator no palco, a expressão corporal, a criação de cenas a partir de textos e exercícios de improvisação”, relembra João Break.

O trabalho desenvolvido resultou na remontagem da comentada Verdade (geração do medo) ou mentira do elástico, peça escrita por Chico e Paulo e apresentada em 1984 pela nova equipe. “O texto trouxe aos palcos questões que permeavam a cidade, tais como moradia, violência, além de questionamentos em relação ao movimento hippie”, conta. O espetáculo ficou em cartaz durante dois anos e percorreu várias escolas de Taguatinga e do Plano Piloto, além das unidades de ensino de Ceilândia, mas durante uma apresentação no Centro Ensino Fundamental (CEF) 4, na QNN 13, a trajetória do Favela começou a mudar.

João Break lembra que em uma das apresentações havia uma mãe na plateia: “Ela ficou escandalizada com uma cena em que apareciam dois jovens nus. Isso foi o estopim. Essa mãe criou um reboliço e um jornal local colocou uma nota a respeito do caso. A nota reverberou de tal maneira que durante um ensaio, no CEF 4, o então Serviço Nacional de Informação (SNI), entidade criada no regime militar, foi ao colégio e interrompeu o ensaio. “Eles chegaram perguntando quem eram os responsáveis pela montagem. Chico e Paulinho se apresentaram imediatamente e o pessoal do SNI anunciou a censura do espetáculo com o argumento de que a peça era subversiva”, lembra João Break.

Os diretores foram processados e o grupo interrompeu as atividades, de 1987 a 1989, período que rolou o processo. “Tentamos uma retomada, mas todos os integrantes estavam trilhando caminhos diferentes”, justifica João Break. Passados os anos de chumbo, a cidade de Ceilândia ganhou, em 1990, o Reserva Cultural, movimento resultante do extinto grupo Teatro Favela. O projeto criado pelo professor Chico Morbeck era um ponto de encontro para os artistas locais e funcionava na residência de Chico. No local, a classe teatral se encontrava para fazer apresentações e preparar novos trabalhos, mas durou pouco tempo.



Fonte: Correio Braziliense

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