Só não vale pornografia. De resto, seja qual for o mote, é só desafiar que o repentista empunha a viola e improvisa seus versos. Para dominar a arte, é preciso talento e técnica, e esses estarão à prova no 1o Festival Regional de Repentistas, de hoje a domingo, na Casa do Cantador, em Ceilândia. O evento promoverá uma disputa entre 10 duplas do Distrito Federal por quatro vagas no concurso nacional, agendado para setembro, no mesmo local. Mais que um desafio, o evento promete ser uma celebração da cultura nordestina. Na abertura haverá shows de forró, enquanto o intervalo dos duelos contará com atrações como a dupla de emboladores Roque José e Terezinha, e o poeta Zé Cardoso.
O nome repente vem do improviso dos versos, feitos “de repente”. Acompanhado da viola nordestina (com sete cordas), é chamado de cantoria. No festival, as duplas terão que mostrar sua competência em sextilhas, mote em sete e em 10 sílabas e disporão de cinco minutos para se apresentar em cada modalidade. Os competidores são avaliados individualmente, mas a pontuação total da dupla é o que vale para a classificação no desafio. O júri contará com cinco integrantes, sendo três cantadores e dois especialistas no gênero.
E quais as características do bom repentista? “Saber rimar e desenvolver a métrica num fraseado que faça sentido, além de boa projeção de voz e presença de palco”, resume Marques Célio Rodrigues de Almeida, diretor da Casa do Cantador do Brasil, quartel-general da cultura nordestina em Ceilândia. Cearense, voz empostada — apesar de não ser artista — ele lembra que Patativa do Assaré, poeta e cordelista popular, não tinha projeção vocal, apesar de produzir versos geniais. Por isso foi mais conhecido pela sua obra escrita.
Ter boa cultura geral é outro requisito importante. A natureza, as questões sociais e a dureza da vida no sertão são temas recorrentes nas cantorias. Para sobreviver a partir de sua arte, os repentistas se apresentam em feiras, nas cantorias chamadas de “pé de parede”, criam jingles publicitários, além de serem convidados para eventos institucionais e exposições, nos quais se apresentam mediante cachê. Segundo Marques, a média de rendimento mensal de um cantador é de cerca de R$ 1.500, mas o valor pode ser mais alto, de acordo com os convites recebidos.
O paraibano Geraldo Queroga, há sete anos em Ceilândia, tornou-se profissional exclusivo da viola há 15 anos, além de compor hinos evangélicos e criar piadas. Não tem um fim de semana livre. “O repentista está sempre pensando em parar de cantar, mas o povo não deixa. E se parar, a gente fica até doente”, diz ele, que gosta de se inspirar em temas ligados à natureza em suas apresentações em casas de família, bares, escolas e empresas. E alerta: “Aqueles grupos que se apresentam na praia por uns trocados depreciam o valor do repentista. O verdadeiro cantador não faz show na rua”.
Segundo Marques, o Distrito Federal e o Entorno contam com aproximadamente 30 cantadores cadastrados na casa, que tem alojamento com capacidade para receber nove artistas visitantes. Um deles é o pernambucano Roberto Silva, que há seis meses se apresenta na capital para, da sua viola, tirar o sustento da família. Filho de cantador, ele é um exemplo de que não há escola que forme repentistas. A tradição é passada de uma geração a outra e o aprendizado se dá na prática. Em casa, no entanto, Silva não terá herdeiros na poesia do improviso: a filha, de 23 anos, está se formando em psicologia, enquanto o filho mais novo é candidato à faculdade de direito.
Os dois tipos de repente mais conhecidos são o de viola, representado no festival da Casa do Cantador, e o coco de embolada, em que os cantadores são acompanhados pelo pandeiro ou pelo ganzá (um tipo de chocalho). Tanto um quanto o outro se baseiam no improviso de versos cantados, mas têm diferenças entre si. Na viola, canta-se muito a natureza, o sertão e a crítica social, enquanto a embolada tem um perfil mais puxado para a sátira.
A tradição de ritmos que unem poesia e improviso está presente em diferentes regiões do Brasil, como no samba de partido alto, no Rio de Janeiro, o cururu, de São Paulo, e a trova, na Região Sul do país, em que geralmente o cantador é acompanhado por acordeão. Todas, por sua vez, remetem aos trovadores da Europa medieval, provável origem das atuais poesias de improviso presentes em diferentes culturas mundo afora.
De hoje a domingo, às 20h, na Casa do Cantador (QNN 32, área especial G, Av. Fundação Bradesco). Duelo entre 10 duplas mais participações de Roque José e Terezinha (coco de embolada) e do poeta Zé Cardoso. Shows de abertura com Forró Biju (sexta), Luizão (sábado) e Trio do Nordeste (domingo). Entrada franca. Classificação indicativa: 16 anos.
Fonte: Correio Braziliense
O nome repente vem do improviso dos versos, feitos “de repente”. Acompanhado da viola nordestina (com sete cordas), é chamado de cantoria. No festival, as duplas terão que mostrar sua competência em sextilhas, mote em sete e em 10 sílabas e disporão de cinco minutos para se apresentar em cada modalidade. Os competidores são avaliados individualmente, mas a pontuação total da dupla é o que vale para a classificação no desafio. O júri contará com cinco integrantes, sendo três cantadores e dois especialistas no gênero.
E quais as características do bom repentista? “Saber rimar e desenvolver a métrica num fraseado que faça sentido, além de boa projeção de voz e presença de palco”, resume Marques Célio Rodrigues de Almeida, diretor da Casa do Cantador do Brasil, quartel-general da cultura nordestina em Ceilândia. Cearense, voz empostada — apesar de não ser artista — ele lembra que Patativa do Assaré, poeta e cordelista popular, não tinha projeção vocal, apesar de produzir versos geniais. Por isso foi mais conhecido pela sua obra escrita.
Ter boa cultura geral é outro requisito importante. A natureza, as questões sociais e a dureza da vida no sertão são temas recorrentes nas cantorias. Para sobreviver a partir de sua arte, os repentistas se apresentam em feiras, nas cantorias chamadas de “pé de parede”, criam jingles publicitários, além de serem convidados para eventos institucionais e exposições, nos quais se apresentam mediante cachê. Segundo Marques, a média de rendimento mensal de um cantador é de cerca de R$ 1.500, mas o valor pode ser mais alto, de acordo com os convites recebidos.
O paraibano Geraldo Queroga, há sete anos em Ceilândia, tornou-se profissional exclusivo da viola há 15 anos, além de compor hinos evangélicos e criar piadas. Não tem um fim de semana livre. “O repentista está sempre pensando em parar de cantar, mas o povo não deixa. E se parar, a gente fica até doente”, diz ele, que gosta de se inspirar em temas ligados à natureza em suas apresentações em casas de família, bares, escolas e empresas. E alerta: “Aqueles grupos que se apresentam na praia por uns trocados depreciam o valor do repentista. O verdadeiro cantador não faz show na rua”.
Segundo Marques, o Distrito Federal e o Entorno contam com aproximadamente 30 cantadores cadastrados na casa, que tem alojamento com capacidade para receber nove artistas visitantes. Um deles é o pernambucano Roberto Silva, que há seis meses se apresenta na capital para, da sua viola, tirar o sustento da família. Filho de cantador, ele é um exemplo de que não há escola que forme repentistas. A tradição é passada de uma geração a outra e o aprendizado se dá na prática. Em casa, no entanto, Silva não terá herdeiros na poesia do improviso: a filha, de 23 anos, está se formando em psicologia, enquanto o filho mais novo é candidato à faculdade de direito.
Os dois tipos de repente mais conhecidos são o de viola, representado no festival da Casa do Cantador, e o coco de embolada, em que os cantadores são acompanhados pelo pandeiro ou pelo ganzá (um tipo de chocalho). Tanto um quanto o outro se baseiam no improviso de versos cantados, mas têm diferenças entre si. Na viola, canta-se muito a natureza, o sertão e a crítica social, enquanto a embolada tem um perfil mais puxado para a sátira.
A tradição de ritmos que unem poesia e improviso está presente em diferentes regiões do Brasil, como no samba de partido alto, no Rio de Janeiro, o cururu, de São Paulo, e a trova, na Região Sul do país, em que geralmente o cantador é acompanhado por acordeão. Todas, por sua vez, remetem aos trovadores da Europa medieval, provável origem das atuais poesias de improviso presentes em diferentes culturas mundo afora.
De hoje a domingo, às 20h, na Casa do Cantador (QNN 32, área especial G, Av. Fundação Bradesco). Duelo entre 10 duplas mais participações de Roque José e Terezinha (coco de embolada) e do poeta Zé Cardoso. Shows de abertura com Forró Biju (sexta), Luizão (sábado) e Trio do Nordeste (domingo). Entrada franca. Classificação indicativa: 16 anos.
Fonte: Correio Braziliense
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