quinta-feira, 1 de abril de 2010

Histórias de Ceilândia

A cidade de Ceilândia comemorou, neste último fim de semana, 39 anos de existência, aparentemente sem se lembrar de seus criadores. Seu idealizador, por sinal, Otomar Lopes Cardoso, faleceu há dois meses, em Natal, aos 74 anos de idade, sem que sobre ele aparecesse uma linha sequer nos jornais de Brasília.

Otomar veio do Rio Grande do Norte para Brasília, a convite do governador Hélio Prates da Silveira, para ocupar o cargo de Secretário de Serviços Sociais. Foi no exercício desse cargo que ele procurou solução para o então mais grave problema social da cidade: as favelas, chamadas de “invasões”, nas quais viviam mais de 70 mil pessoas. A “Invasão do IAPI” era a maior delas e tinha esse nome por situar-se nas proximidades do antigo hospital do IAPI (extinto Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Industriários), em frente da entrada da Candangolândia.

A solução encontrada e aprovada pelo governador consistiu em urbanizar uma área, próxima de Taguatinga, dividi-la em lotes e para eles transferir os ocupantes das “invasões”. Os barracos seriam remontados nos fundos dos lotes, para permitir que, com o tempo, pudessem ser construídas, na frente, casas de alvenaria.

Otomar lançou a Campanha de Erradicação das Invasões, cuja sigla era CEI. Daí o nome Ceilândia. Era um trabalho gigantesco, visto até com certa reserva, por exemplo, por outro potiguar, o diretor-presidente do Correio Braziliense, Edilson Cid Varela, um dos primeiros a tomar conhecimento da Campanha. Ele deu, no jornal, porém, toda cobertura e apoio à iniciativa.

O que parecia quase impossível, tornou-se realidade pelas mãos competentes da assistente social da Fundação do Serviço Social Maria de Lourdes Abadia, a quem coube comandar a equipe encarregada de fazer o levantamento das famílias que tinham direito aos lotes e de promover a transferência dos barracos. O destaque por ela conseguido, com o bom trabalho realizado, abriu-lhe caminho para uma carreira política que a levou à Câmara dos Deputados e até ao Governo do Distrito Federal.

Otomar tinha a idéia de montar, nas entradas do Distrito Federal, postos de orientação para famílias de imigrantes, as quais seriam informadas sobre inexistência de local para morar e sobre as dificuldades de obter trabalho. Se quisessem, teriam ajuda para voltar ou para dirigir-se a outros destinos. Seria a forma de ao menos inibir a formação de novas favelas. A idéia, porém, não chegou a ser posta em prática. O governo de Hélio Prates estava se encerrando. E aí vieram governantes que até estimularam a vinda de imigrantes, acenando com a possibilidade de ganharem lotes aqui. O inchaço demográfico – que ocorreu em todos os grandes centros urbanos – foi aqui incentivado também graças à autonomia política e administrativa que alguns políticos conseguiram para o Distrito Federal, pois esses “assentados” poderiam ser convertidos em eleitores quase cativos. E deu no que deu.

A história de Ceilândia foi aqui lembrada não apenas pelo seu aniversário, mas também em homenagem póstuma a Otomar Lopes Cardoso.


José Ricardo da Costa
* O autor é jornalista.


Fonte: Blog do Zé Ricardo

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